14/08/2012

IGREJA E POLÍTICA


Este post se originou na time line da minha página no Facebook. Como houve reações interessantes a minha opinião lançada no Face, resolvi coloca-la aqui Blog também. Originalmente o post foi este destacado em itálico:


"Na boa, de certa forma me irrito com propaganda que vejo de candidatos que são pastores. Como um pastor, principalmente aqueles que tem um ministério ativo numa igreja, que (ja digo "a priori") tem um chamado para cuidar de ovelhas pode conjecturar em lançar candidatura? Como que imerso nas demandas da vida política ele conseguirá dar conta do seu ministério!? 
Pra mim, esse tipo de coisa me indica no mínimo um desleixo com a vocação ou uma crise com a mesma. "Buscai primeiro Reino de Deus." -> isso em um ministério pastoral sério é pra ser levado muito a sério.
E outra, esse papo de "irmão vota em irmão" é extremamente alienante. Irmão consciente vota em candidato com propostas interessantes, relevantes e viáveis. Igreja é uma coisa e Estado é outra."

Uma das primeiras reações interessantes ao post foi de uma amiga que disse "esse "irmão vota em irmão" faz algum sentido quando significa o seu direito de votar em quem tem os mesmos valores e conceitos de sociedade que você e, portanto, defenderá os mesmos temas que você, que é um princípio desse modelo de democracia em que um grupo escolhe um indivíduo para representá-lo. Mas francamente, além da questão da vocação, sobre a qual concordo com você, nem acho que esses indivíduos tenham de fato os mesmos valores e conceito de sociedade que eu..." 

Bom, realmente minha amiga conseguiu dar algum sentido a essa fórmula (do "irmão vota em irmão"), embora creio que ela não tenha sido concebida com esse refinamento para sua postulação e também penso que não seja utilizada com essa conotação, mas na verdade com intuito de simplesmente angariar votos dos fiéis. Contudo, de certa forma ela a justificou.

Sobre os valores, há valores que são inerentes, próprios e advindos da religião (da fé, e ai entenda isso de maneira genérica não só a fé cristã, mas outras tantas crenças existentes) os quais se deve defender e praticar na comunidade de fé. Mas estes valores não podem nortear o direito civil, pois da sociedade civil emana necessidades que demandam normas que as atendam. Temas que por vezes, como cristão, me dói pensar que a sociedade chegou num ponto de afastamento Deus (e nisto já estou expressando o fato de ser cristão) que o Estado tem que normatizar temas que antes não havia necessidade de normatizar. Mas, a despeito de minhas crenças pessoais, o Estado deve ser e permanecer laico e com essa mentalidade deve ser constituído o direito à todos.


Como evangélico, devo lembrar de como éramos tratados de maneira hostil ainda no começo do século passado. Para se ter uma noção a possibilidade de construir templos ou capelas com "cara" de igreja é recente para os protestantes aqui no Brasil na Constituição Imperial de 1824 afirmou o artigo 5º: "A religião católica apostólica romana continuará a ser a religião do Império. Todas as outras religiões serão permitidas com seu culto doméstico ou particular, em casas para isso destinadas, sem forma alguma exterior de templo". Sofremos muita perseguição por ter uma constituição baseada numa determinada religião "X" não é porque hoje temos uma "bancada evangélica" nas câmaras de deputados federais que devemos oprimir determinado grupo "A" ou "B" baseado em nossos valores cristãos. Devemos, sim, brigar pela perenidade/permanência de  um Estado Laico que tanto nos fez falta quando nós, cristão evangélicos, éramos os perseguidos.


Neste final post serei até bem particular na minha fala, porque falarei com um cristão protestante batista. Sim, porque tenho certo orgulho numa particularidade que esta denominação teve na sua história de sempre defender (com raríssimas exceções) a separação entre Estado e Igreja. Por isso muitos de nós, quando ainda éramos  denominados anabatistas, à época da Reforma e Contra-Reforma (Inquisição) morremos pois não tínhamos apoio e proteção de príncipes, reis ou de governantes  pois se defendia que um devia seguir o seu caminho separado do outro.

Se o cristão deve fazer política? Sim, penso que sim! Política, como vemos no dicionário, é a arte de promover o bem-estar e, neste sentido o cristão e a Igreja tem que ser naturalmente políticos. Na sua relação com eleições o cristão, como um bom cidadão, deve ser bem cônscio na hora de votar. A minha questão específica aqui reside no fato de um pastor se lançar candidato, reflexão que se originou ao passar pela rua e ver um cartaz do candidato "Pastor Fulano de Tal" ao cargo de vereador. Penso que só se ele vier a pedir licença do ministério dá pra admitir uma coisa dessa (mas ainda não fico muito confortável com isso); Do contrário, repito o que disse no começo, ou há crise na vocação ou desleixo com a mesma uma vez que não há possibilidade de conciliar as demandas advindas da política com as demandas advinda da vida das ovelhas e da igreja como um todo.

Por fim, dou graças a Deus por viver num "Estado Democrático de Direito Laico" e poder compartilhar a minha opinião que pode muito bem divergir da sua e ambos devemos nos respeitar nas nossas particularidades e opiniões. E na minha defesa pela laicidade termino o post com Voltaire que disse certa ocasião "Posso concordar com nada com que dizes, mas lutarei até o fim pelo direito de dizê-lo".

4 comentários:

  1. Muito bom o post! Também sou Batista, mas vejo que essa postura de Estado e Igreja separados gerou alienação.
    Até mesmo recentemente um pastor batista foi querer se meter nas últimas eleição para presidência e invés de falar de política ele foi partidário. maior fail!

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    1. Se acho que sei do que falou, lembro perfeitamente da situação, e houve sim um equívoco em atacar um determinado partido ao invés de abordar a questão pura e simplesmente.

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  2. Para os atuais dias de Brasil, deve dizer que a discussão levantada é, sem dúvida pertinente. Mas quanto à opinião da "amiga", penso que ainda é levemente alienada (sem realmente querer ofendê-la). Segundo essa linha de raciocínio devo considerar que qualquer um que se identifique comigo (e no caso do cristão, estou falando prioritariamente de valores de crenças) deva ser capaz de desempenhar o papel de meu representante. Mas humildemente acho que não deve ser assim. Devo procurar alguém antes de tudo capacitado tecnicamente para desempenhar um papel de administrador publico. Exemplificando: se meu bairro vai mal, alguem antigo, com conhecimento das questões do bairro, das necessidades; se a saúde vai mal, alguém que tenha conhecimento de causa, que saiba mesmo onde atuar (nem precisa ser médico); e assim por diante, seja vereador, prefeito, deputado ou acima disso.
    WSM

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    1. Sim, sim... de fato, você está certo. Talvez a admissão da justificativa que ela apresentou seja um pequeno, frágil e sensível conforto pra nos dar alguma luz de ética a alguma coisa que não vem sido pautada pela ética...
      Mas, é fato, a escolha deve ser muito mais realizada/determinada pela qualificação.

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